Lei da não interferência

Embora as palavras nasçam de forma espontânea e escrever seja algo natural para mim, confesso que ultimamente até as palavras me parecem limitadas para expressar o tanto e tão profundo que tenho vindo a sentir nos últimos tempos sobre a vida e o ser humano. E até o tempo me parece diferente, por vezes inexistente, outras vezes eterno, seja numa hora, seja num mês, ou em anos. Mas sobre isto falarei em breve e com mais detalhe, porque daqui a pouco tenho de ir fazer a mala porque preciso de parar, quer no tempo, quer nas palavras. 

Mas porque vos escrevo especificamente hoje, em dia de lua incrivelmente laranja e gigante, pôr do sol mágico de primavera com temperatura de fim de tarde de verão, e páscoa com cheiro a São João pela imensidão de pessoas na rua? 

Porque algo em mim me diz que, sem saber porquê mas sem duvidar, alguém vai ler esta mensagem e saborear o valor desta forma de olhar a vida e o ser humano. 

O Miguel Sousa Tavares disse recentemente numa entrevista que aprendeu com a mãe a olhar as pessoas, e eu, embora sendo um ser mais naturalmente acústico do que visual e a minha essência de Projetor foque de forma inata a essência do outro, tenho aprendido a olhar as pessoas e ver além da superfície, arte ainda em fase de aprendiz, mas já com um sentir da proximidade da possibilidade de mestria com a idade e dedicação a Ver cada Ser como único que é e sem assumir que sei quem ele é. 

Mesmo conhecendo o mapa de Human Design, que nos dá o Manual de Instruções e a mecânica correta de viver, não sabemos quem o outro É

Como dizem no filme Avatar “I See You” e não “Amo-te”. E este “ver” não é as formas do corpo, as roupas, os carros, a maquilhagem, os posts nas redes, os cargos no LinkedIn. 

E esta é a mensagem principal de hoje – sabemos muito pouco, ou nada, sobre outro ser pelo que não temos o direito e temos a responsabilidade de não julgar, opinar, interferir

Há uns dias uma cliente que trabalha na área da psicologia disse-me que uma das aprendizagens que teve durante os anos de trabalho em conjunto, foi através da observação do cuidado que tenho em não interferir no caminho de cada um, reconhecendo o quão difícil é não o fazer. E admito que é muitas vezes tentador querer ajudar o outro a fazer um “shortcut”. Mas quase nunca a estrada mais rápida é a mais interessante! 

Desde que comecei o meu estudo, e posteriormente trabalho com o Human Design, percebi o quanto o ser humano procura as respostas fora e não dentro, quando cada um de nós tem sempre a decisão, escolha, a resposta dentro de si, e o nosso papel verdadeiro é ajudar, guiar para esse centro de si mesmo. 

Uma aluna disse no último fim de semana de formação que, até chegar a este conhecimento de si mesma, sentia que estava sempre a ser puxada por várias pessoas, em várias direções e que se sentia muito confusa e que só agora consegue “ouvir-se” e seguir as suas respostas e não as das pessoas que a “guiavam” e com a melhor das intenções muitas vezes, mas quase sempre com o pior dos resultados. 😊 

Já dizia a sabedoria popular que se os conselhos tivessem valor seriam vendidos e não dados. Mas o mais curioso, é que agora, há muitas pessoas a “venderem” opiniões e soluções, muitas vezes baseadas em algo que funcionou na sua vida, num curso que fizeram, num livro que leram, mas que em quase nada se adequa à pessoa que está a “comprar” o conselho.  

Tudo pode ter valor, mas só o que é identificado e experimentado ou experienciado pelo próprio poderá ter verdadeiro valor. 

Durante uns tempos escrevi uns artigos que começavam desta forma: “Em nome do amor, só fazem m***da”! Porque também há muitas pessoas generosas a genuína e desinteressadamente oferecerem conselhos. Mas mesmo que inconscientemente, são tantos os motivos pelos quais o ser humano interfere, ou pelo menos tenta interferir na vida dos outros. E começa logo com os pais que decidem desde cedo pelos filhos, retirando-lhes a autonomia e criando insegurança e dependência, por “amor”, não os ensinando a ser quem são realmente. 

Sejamos capazes de Ver, sentir, intuir, mas não interferir.  

Partilhar conhecimento e experiências e ensinar as ferramentas, mas permitir que cada um seja quem é e descubra por si mesmo, porque o “conhecimento emprestado” não é real. 

E cada um, com os seus dons inatos, o seu exemplo e em Verdade, poderá ajudar nestes tempos de transição para que a vida aconteça em respeito pela singularidade de cada ser, sem interferência. 

Com amor, 
Idalina Fernandes